Um dia, nos escapam das mãos...
Volta pro ovo! - queremos dizer - como na canção.
Mas o ovo se faz pequeno para a vibração de um pássaro novo. O ninho já não basta como extensão de si mesmo; não mais reflete suas necessidades primárias.
O pássaro quer voar. O pássaro precisa voar.
Houve o tempo em que nos víamos agigantados nos olhos desses pequeninos seres voláteis, heróis domésticos que éramos, mas de tal forma reconhecidos que nos convencíamos de nossos dons extraordinários.
De fato, somos fabulosos na arte de gerar, nutrir, desenvolver, ensinar, conduzir, proteger e tudo mais que sabemos fazer sem que ninguém nos ensinasse, até vê-los como estão, crescidos e atrevidos.
Foram-se as penugens que alisamos, o bico esfomeado, o novelo de plumas que se escondia em nossas asas.
Tudo que vemos agora são penas arrepiadas e rebeldes, difíceis de alisar.
E o suave trinado que já se fez cheio de notas, agora vem nos ferir os ouvidos com a estridência de uma nota só.
O fato é que um dia eles crescem, abrem, sem avisar, as asas delicadas e no tempo de um espirro nos deparamos com a envergadura do filhote. O gesto se antecipa e anuncia a extensão do salto.
Volta pro ovo!! - queremos dizer - mas não nos ouvem, envolvidos que estão no intenso farfalhar das asas debutantes.
Então olhamos para nós, pássaros de penas ralas, e nos empenhamos em lembrar as palavras mágicas, na esperança de recuperar poderes há muito aposentados.
Desprovidos dos antigos recursos, nada nos resta fazer senão admirar o vôo desses calouros emplumados, pintainhos que fizemos crescer com nossos mimos, e a quem demos asas para que brincassem à nossa volta.
Mas eis que se definem no estilo e na performance: que lindos volteios, que rasantes, que belos planadores se revelam!
E como sobem com determinação, para depois mergulhar vertiginosamente no espaço e logo conter o ímpeto, com precisão, antes de tocar o chão num pouso de mestre.
Estão a nos estufar o orgulho.
De fato, não há como querer contê-los, aliás, já se foram, em revoada, silfos barulhentos que ensinamos a voar, para que um dia pulassem do ninho e, corajosamente, voassem.
* * *
Ah!... O amor por nossos filhos...
Aprendemos a amá-los de tal forma, que é totalmente compreensível a dificuldade que temos em deixá-los alçar vôo por conta própria.
Para mim ainda são crianças! - proclamam alguns pais, mirando com carinho seus rebentos gigantes.
Mas aí vêm os sábios, a vida e a natureza, e nos dizem que não somos seus donos, e que o amor maduro é aquele que sabe libertar.
E o coração de pai, de mãe, então, apertados, começam a aprender a libertar.
E nesse processo lento, natural, percebem que, se amam realmente, devem pensar no que seja melhor para o objeto de seu amor, e não mais para si.
Não há como fugir de tal realidade da existência, é certo...
E nesse caminho sem volta, vamos percebendo que a dor inicial da separação vai sendo substituída por uma felicidade sem igual.
A felicidade de se perceber, finalmente, que cumprimos nossa missão e que, ao libertar, estamos ganhando um amor para todo o sempre.
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